terça-feira, 22 de janeiro de 2013

Diversidade Religiosa e os Desafios Pedagógicos do Olhar Pluricultural



Discutir o campo da religião na educação é uma tarefa delicada e complexa. Torna-se delicada pois é um campo que vai ao encontro das crenças de cada um, suas esperanças, muitas vezes suas fontes de vida e sua interioridade são tocadas nesta discussão. É um campo complexo na medida em que além das questões de subjetividade, entra em cena um conjunto de dispositivos políticos, psíquicos e sociais. Sendo assim, neste texto busco uma reflexão de cunho mais pessoal, pautado na minha experiência. E aqui não penso experiência como algum acontecimento do mundo, algum conhecimento sobre o mundo, algo científico e sim como uma vivência vivida em toda sua intensidade e que tenha me tocado, no sentido, de produzir novas formas de pensar.

Desde pequeno aprendi que era preciso ter uma religião. Que existia nossa religião – aquela que aprendi com meus pais – e os católicos. Sempre tive muito curiosidade em saber por que muitos dos meus amigos não frequentavam a mesma Igreja que eu. Este movimento de inquietação foi me acompanhando durante toda a infância, adolescência, até na faculdade. Na medida que interagia com novas formas de perceber o mundo e a vida, por meio de outros olhares religiosos, conseguia refletir e olhar para minha própria história religiosa, ora assustando-me, ora encantando-me, ora compreendendo o colorido que brotava destes encontros. E penso que seja uma pista para promover algumas reflexões, no sentido de pensar a prática com o ensino religioso.

Como pensar o ensino religioso numa escola laica? Penso que existem algumas possibilidades para responder esta pergunta. Acredito que o ensino religioso pode ser um espaço fomentador das discussões sobre a diversidade religiosa. Não penso um ensino religioso como um “ensinar religiões”, um campo moralizador. E sim, como um compreender que o mundo é diverso e plural, existindo muitas formas de religiosidade e de olhar e se relacionar com a vida. E é este movimento de compreensão do ensino religioso, como espaço de pluralidade e diversidade, abertura para o diálogo e o conhecimento de novas perspectivas, que acredito que podemos avançar, pelo menos dar um passo a mais, na discussão da diversidade religiosa na escola. 

Em muitas que trabalhei discutia-se o ensino religioso, os símbolos que estavam presente e foram muitas as discussões que iam surgindo. Era comum dar-se conta de cruzes nas salas. Repensar a Páscoa e o Natal no cotidiano da prática pedagógica sempre era um dos maiores desafios. Pois geralmente existe uma cultura enraizada que tenta manter a “tradição”. No entanto, na perspectiva que estamos discutindo, importante seria promover múltiplos estudos, genealógicos e pluriculturais sobre este acontecimento em diversas perspectivas e crenças. Não na perspectiva de confronto com essa e aquela religião, e sim promover um espaço mais colorido e vivo, com movimentos de histórias - muitas vezes silenciosas ou em estado de invisibilidade social - e formas de viver a vida.

Por fim, colocar a diversidade religiosa em discussão, exige alguns afastamentos necessários para com aquilo que muitas vezes parece normal, pertencente e quase natural na prática pedagógica. Exige abrir-se para a existência de outras formas de compreender o mundo. Não na tentativa de encontrar um consenso, mas sim de valorizar a potência de cada perspectiva.  

Luís Carlos Zuze Dhein
Texto elaborado para uma atividade do curso de Produção de Material Didático para a Diversidade

segunda-feira, 21 de janeiro de 2013

Diversidade – Quando uma pergunta silenciosa rompe com muitos silêncios



            Toca o sinal. Uma forte movimentação, passos acelerados vão agitando os corredores. A vida vai se confinando nas salas, ou poderíamos dizer que múltiplas vozes vão se encontrando em um espaço singular, fechado no espaço físico da sala de aula, onde existem possibilidades de diálogos reconstrutores de realidades.

Todos entram e sentam. Sentar-se é uma metáfora interessante para pensarmos uma certa perspectiva de escola. No entanto, com agito contemporâneo este sentar-se ganha novas significações. Ganha a dimensão de espaço-tempo para escutar, concentrar-se para olhar e pensar mais devagar. Sentados, todos se organizam, olhares atentos para saber as atividades do dia.

Na sala do 4º ano do ensino fundamental, sentados, escutam o tema do dia: estudar os símbolos da Páscoa. Será utilizado o laboratório de informática, pois é preciso utilizar a Internet. Após pesquisar, será produzida uma apresentação de slides - explicava a voz do comando que estabelecia o que fazer.

Abre-se o laboratório. Grande movimentação, pois todos querem sentar sozinhos nos computadores. Mas, não tem computador para todos. Após algumas discussões, tudo resolvido e formam-se algumas duplas. Começam a pesquisa... sino, ovelha, uva... e outros símbolos que haviam sido listados pela voz do comando. No entanto, uma voz silenciada, promove um silencio coletivo no espaço. Após perguntar: “- Eu não sei o que é a Páscoa”.

Aquela pergunta inicialmente causou irritação. O silêncio da turma soava como uma espera por palavras. Palavras que apenas o professor naquele momento poderia dizer. E se assumir professor naquele momento era dar voz para aquele silêncio. Pergunta silenciosa que rompeu com vários silêncios. Mas, naquele momento o professor não falou. A pergunta ecoava e batia em vários pilares internos daquele professor. A voz do comando que estabelecia, agora se sentia desafiada e tocada. Vários colegas tentaram dar sua voz, buscando cobrir aquele silêncio que ecoava na sala. No entanto, após longa pausa, o professor falou. Aquele acontecimento produziu algo que o professor não conseguia explicar. Era um sentimento que parecia ter desafiado ele a trocar suas vestes. Dar voz aos silêncios. Chamou todos para o centro da sala e organizou uma roda de conversas. Pediu para que o silêncio se tornasse voz. Mudou sua aula com aquele acontecimento. Combinou com a turma que cada um iria organizar um slide apresentando como sua família vivia esta data.

Trabalhou-se durante duas semanas na pesquisa e produção dos slides. A atividade que acabou virando projeto finalizou em um seminário. Todos ansiosos esperavam ver seus trabalhos projetados “na tela grande” como diziam. Muitas vozes ecoaram naquela sala durante aquela tarde. Uma multiplicidade de olhares foi apresentada. Um conhecimento colocado em movimento. Aquela pergunta silenciosa promoveu a ruptura de muitos silêncios. Aquela turma aprendeu que as verdades são múltiplas assim como as realidades. Naqueleaturma de 4ºano a vida pulsou com outra intensidade. Conta-se que aquele professor que antes de perceber-se professor, acreditava-se voz de comando, aprendeu com aquela pergunta-martelo, que a diversidade da vida esta em dar voz aos silêncios, em abrir-se para o múltiplo, e hoje este professor arrisca-se a vir aqui compartilhar esta aprendizagem que muito sua maneira de agir pedagogicamente mudou.

Escrito por Luís Carlos Zuze Dhein
*Escrevi este texto para uma atividade do curso de Produção de Material Didático para Diversidade,

quinta-feira, 3 de janeiro de 2013

Distanciamentos de si: Jogando ideias sobre os redemoinhos do contemporâneo 1



A vida é acontecimento. Sempre arriscado escrever sobre a vida. Não pretendo definir modelos e nem profetizar formas de viver. Nas próximas postagens tentarei compartilhar algumas reflexões, indignações e percepções sobre a contemporaneidade, a fim de problematizar algumas questões que parecem importantes de serem retomadas neste momento histórico da existência humana. Talvez seja possível chamar isto de um exercício político sobre a própria invenção de si. Ou em outras palavras, uma análise sobre os distanciamentos necessários para perceber o que estamos fazendo com nós mesmos. Sem a pretensão de entrar em discussões conceituais e filosóficas, espero que a gente leia esta pequena sequência de textos como uma conversa que se inicia sob a luz da tecnologia escrita, sem a pretensão de se prender demais as suas gramáticas e racionalidades, sem eliminar uma boa conversa aos sons e aromas da vida que pulsa sob o agito dos dias.

Como definimos tempo? E o que estamos querendo dizer quando falamos em espaço?

Tempo e espaço parece ser um ponto importante para começarmos. Com o advento das tecnologias digitais e em rede inaugurou-se novas formas interativas entre seres humanos. Desta forma, não é exagero dizer que estamos vivendo um momento muito sério de reconfiguração da nossa percepção do tempo e do espaço.  De um tempo marcado e cronometrado, passamos para um tempo líquido, fluído, atemporal. Muitos tempos em um único tempo.
Durante a modernidade intensificou-se a ideia de delimitação e fragmentação do tempo, sob a lógica industrial e de quadriculamento. Fragmentou-se os dias, criou-se os turnos e as jornadas de trabalho. Horários marcados por sinais sonoros: sirenes, apitos, sinos. Saiu-se de uma perspectiva de tempo cíclico, movido principalmente pelos fenômenos da natureza, para uma perspectiva linear do tempo, pautada fortemente nos relógios, na administração dos tempos da vida. Na contemporaneidade começa-se a viver uma nova perspectiva, pois o tempo parece não mais existir nesta forma tão marcada. Um exemplo: podemos abrir nosso navegador de Internet e nos conectarmos com várias pessoas ao mesmo tempo e que podem estar em diversos lugares do mundo, com horário bem diferentes um dos outros.
Nesta nova perspectiva corre-se o risco de uma aceleração caótica, uma sensação de tempo sem tempo, onde se quer fazer sempre mais em menor espaço de tempo. Uma tentativa de imitação das abas no navegador que nos permite zappear em vários sites ao mesmo. Isso vai produzindo formas de existência, provocando muitas vezes uma ideia de que não se tem mais tempo para analisar e refletir. Os discursos das novas administrações ou gestões, fomentam a ideia de que tudo precisa ser agilizado sob uma ótica acelerada e quanto mais produtiva melhor. 
Dar-se tempo e espaço para refletir e tomar decisões, é uma negação a produtividade, nesta nova forma de perceber as temporalidades da vida. É importante ressaltar que esta dinâmica temporal nos abre um campo enorme de possibilidade. Inclusive uma de suas maiores promessas é proporcionar mais tempo para que possamos fazer coisas de nosso interesse. É importante lembrar que sob estas novas formas temporais da existência, sopram ventos nem sempre tão favoráveis. Alimenta-se uma nova lógica, sem barreiras temporais, que permite nossa inserção completa (corpo e alma administrados), subjetivamente falando. Nos próximos tópicos abordaremos mais a fundo estas lógicas que sopram no lado sombrio desta nova percepção sobre o tempo. 
Por fim, acabo de lembrar da promessa de escrever sobre a noção de espaço nesta nova lógica contemporânea, assunto que será retomado nas próximas postagens.

E para vocês tempo e espaço, como definir em tempos de tecnologias digitais em rede?